Um dia preso no passado
das lembranças, me voltei para trás e contemplei algumas cenas engraçadas.
Quando fugi de casa ou até mesmo quando brincava na escola, a inocência era
algo eterno e tão presente. Entretanto, a vida dissolve o cotidiano infantil e
nos prepara para as épocas de amadurecimento.
Crescer custa à troca
de muitas dores e sons de palavras lamentáveis dos dias comuns. Das roupas
ditadas pela moda e dos gritos contidos pelo sistema. Como é bom ser criança e
não saber a verdade sobre as intenções do ser humano.
Eu ainda era criança
quando Ruanda - país localizado na África Central - em 1994, foi devastado por
um genocídio dilacerado pela violência, pelo transtorno dos valores e pela
inquietação de uma etnia.
A nobreza Tutsi, junto
com a inicial administração dos Belgas, subjulgou os Hutus - etnia da massa
populacional - ao descaso social. Era um só povo que foi divido por interesses
tão mesquinhos que os motivos apresentados diante da vida em suas
singularidades básicas - como: respeito, harmonia, integridade e paz - se
tornam superficiais.
A constante situação
humilhante, desumana, sufocada da impossibilidade de sonhos ou aspirações, em
que se encontravam os hutus, gerou um ódio no coração dos que compunham essa
identidade de uma massa modelada para ser excluída.
O resultado não poderia
ser diferente: o genocídio achou o seu lugar na história onde a morte não
escolhe povo e elite, pois igualou na correnteza do sangue, a fúria dos
homens. Existem hipóteses de que tudo foi planejado. Existem vidas que não
sobreviveram para contar a verdade.
Hoje, onde não sou mais
criança e Ruanda continua procurando a paz, as consequências de tal horror
ainda persistem. No território ruandês, a raça africana ainda busca a cura da
sua fome, da sede, das lembranças, do medo e da própria vida. É caos produzido
pela constelação das estrelas negras.
Por isso, enquanto eu
era criança, Ruanda brincava de tentar existir.
_Manuela Felix_
P.S: Tema sugerido por Walcler Junior